ANO NOVO, VIDA NOVA. É um provérbio comum a muitos países e pertença de muitos povos. Mas será, por certo, o ditado mais traído de quantos são atribuídos à sabedoria popular.
Acontece, naturalmente, assim, porque «Ano novo, vida nova» se trata de uma manifestação de intenção que, posteriormente, não encontra tradução na prática, não se consuma na vida real. Por estas e por outras, também o povo diz que «de boas intenções está o inferno cheio».
No início, um novo ano, como este agora iniciado, é uma mão-cheia de nada, que é como quem diz um espaço onde cabem todos os sonhos que gostaríamos de ver realizados.
É assim como quando andávamos na escola e começávamos um caderno novo. A perfeição das primeiras páginas não encontrava equivalência nas restantes, como se ao princípio de qualquer coisa desejássemos sempre tudo e acabássemos o que quer que fosse à medida das possibilidades.
A mudança de um ano para o seguinte é tradicionalmente assinalada pelo deitar fora de calendários, pela passagem de moradas e de números de telefone de uma agenda para outra, pelo envio de votos de felicidades postais, que valem tanto quanto uma estampilha custa, mais o valor de uma lembrança expressa em palavra amiga.
Uma crónica de princípio de ano também pode ser isso. Mas é igualmente verdade que pode não ser, constituindo apenas a continuação do ritmo de uma certa rotina, que se recusa a marcar efemérides. Procurarei, no entanto, que esta crónica, para o número correspondente a Janeiro de uma revista mensal seja, sem ser, o voto de que as coisas e as pessoas mudem, para melhor nos próximos trezentos e sessenta e cinco dias e que tudo aconteça à medida dos desejos de cada um.
Desejo-vos, portanto, um bom ano para todos, sem sininhos nem lugares-comuns, nem peditórios para os cronistas desta área, que sem dúvida não deixariam de se associar aos meus augúrios de que o ano em que entrámos seja cheio de vida, de saúde e de dinheiro suficiente à realização dos nossos sonhos. Se nada mudar, que se mantenha pelo menos o bastante à nossa dignidade, e que se aguentem a nossa capacidade de resistência e a vontade de ter esperança.
«Foi um ano para esquecer», há, infelizmente, quem diga, referindo-se a um determinado período menos afortunado que encontra correspondência na bola preta que assinala quarentenas, doenças do próprio ou de familiares, desemprego, morte, azares diversos, infortúnios avulsos. Também essa vontade de esquecer não tem sinceridade, porque semelhantes reveses não se esquecem. O que quer essa expressão significar é «Vamos lá a ver se este ano é melhor», porque o que se deseja, de facto, é uma compensação às malquerenças dos tempos aziagos.
Por falar em bola preta, recordei-me dos rebuçados dos bonecos da bola. Daqueles em que a gente furava um cartão, dividido em quadradinhos, a cada um dos quais correspondia uma bola de cor, que significava um determinado rebuçado, envolvido num cromo de um jogador de futebol. E consoante o número e o boneco, calhava o prémio - este melhor, aquele pior.
Se tomarmos aquele cartão pela nossa vida e a dividirmos em quadradinhos que são os anos que a compõem, o que eu desejo sinceramente é que não haja para ninguém bolas pretas, que normalmente não traziam nada de bom. Que cada ano para todos nós seja um boneco da bola com um bom prémio atrás, se não for mesmo o número da bola de cauchu, que era a nossa grande alegria naqueles anos de contentamento fácil e de vida difícil.
Porque a caderneta, meus amigos, essa teremos de ser nós a preenchê-la e a completá-la, com jeito nas mãos e tento na cabeça, sem que nenhuma bola preta justifique desânimo ou desistências.
Ao enfrentarmos mais um cartão, de furadouro na mão, que a sorte nos guie o gesto e nos ponha o golpe no sítio certo. Que este ano seja o ano do sorriso, da tolerância, da paz e da felicidade realizável. São estes os meus votos para todos nós, que podemos estar unidos nas coisas simples e possíveis. Mas se assim não for, paciência. Se não acerarmos no boneco da bola, no «mais difícil», podemos sempre continuar a tentar, enquanto nos imaginamos protagonistas, jogando num grande estádio, cheio por uma grande multidão entusiasmada, pensando que o nosso retrato embrulha o rebuçado mais difícil - o do número da bola.
Mesmo que tenhamos de passar mais um ano a dar chutos na trapeira.
Acontece, naturalmente, assim, porque «Ano novo, vida nova» se trata de uma manifestação de intenção que, posteriormente, não encontra tradução na prática, não se consuma na vida real. Por estas e por outras, também o povo diz que «de boas intenções está o inferno cheio».
No início, um novo ano, como este agora iniciado, é uma mão-cheia de nada, que é como quem diz um espaço onde cabem todos os sonhos que gostaríamos de ver realizados.
É assim como quando andávamos na escola e começávamos um caderno novo. A perfeição das primeiras páginas não encontrava equivalência nas restantes, como se ao princípio de qualquer coisa desejássemos sempre tudo e acabássemos o que quer que fosse à medida das possibilidades.
A mudança de um ano para o seguinte é tradicionalmente assinalada pelo deitar fora de calendários, pela passagem de moradas e de números de telefone de uma agenda para outra, pelo envio de votos de felicidades postais, que valem tanto quanto uma estampilha custa, mais o valor de uma lembrança expressa em palavra amiga.
Uma crónica de princípio de ano também pode ser isso. Mas é igualmente verdade que pode não ser, constituindo apenas a continuação do ritmo de uma certa rotina, que se recusa a marcar efemérides. Procurarei, no entanto, que esta crónica, para o número correspondente a Janeiro de uma revista mensal seja, sem ser, o voto de que as coisas e as pessoas mudem, para melhor nos próximos trezentos e sessenta e cinco dias e que tudo aconteça à medida dos desejos de cada um.
Desejo-vos, portanto, um bom ano para todos, sem sininhos nem lugares-comuns, nem peditórios para os cronistas desta área, que sem dúvida não deixariam de se associar aos meus augúrios de que o ano em que entrámos seja cheio de vida, de saúde e de dinheiro suficiente à realização dos nossos sonhos. Se nada mudar, que se mantenha pelo menos o bastante à nossa dignidade, e que se aguentem a nossa capacidade de resistência e a vontade de ter esperança.
«Foi um ano para esquecer», há, infelizmente, quem diga, referindo-se a um determinado período menos afortunado que encontra correspondência na bola preta que assinala quarentenas, doenças do próprio ou de familiares, desemprego, morte, azares diversos, infortúnios avulsos. Também essa vontade de esquecer não tem sinceridade, porque semelhantes reveses não se esquecem. O que quer essa expressão significar é «Vamos lá a ver se este ano é melhor», porque o que se deseja, de facto, é uma compensação às malquerenças dos tempos aziagos.
Por falar em bola preta, recordei-me dos rebuçados dos bonecos da bola. Daqueles em que a gente furava um cartão, dividido em quadradinhos, a cada um dos quais correspondia uma bola de cor, que significava um determinado rebuçado, envolvido num cromo de um jogador de futebol. E consoante o número e o boneco, calhava o prémio - este melhor, aquele pior.
Se tomarmos aquele cartão pela nossa vida e a dividirmos em quadradinhos que são os anos que a compõem, o que eu desejo sinceramente é que não haja para ninguém bolas pretas, que normalmente não traziam nada de bom. Que cada ano para todos nós seja um boneco da bola com um bom prémio atrás, se não for mesmo o número da bola de cauchu, que era a nossa grande alegria naqueles anos de contentamento fácil e de vida difícil.
Porque a caderneta, meus amigos, essa teremos de ser nós a preenchê-la e a completá-la, com jeito nas mãos e tento na cabeça, sem que nenhuma bola preta justifique desânimo ou desistências.
Ao enfrentarmos mais um cartão, de furadouro na mão, que a sorte nos guie o gesto e nos ponha o golpe no sítio certo. Que este ano seja o ano do sorriso, da tolerância, da paz e da felicidade realizável. São estes os meus votos para todos nós, que podemos estar unidos nas coisas simples e possíveis. Mas se assim não for, paciência. Se não acerarmos no boneco da bola, no «mais difícil», podemos sempre continuar a tentar, enquanto nos imaginamos protagonistas, jogando num grande estádio, cheio por uma grande multidão entusiasmada, pensando que o nosso retrato embrulha o rebuçado mais difícil - o do número da bola.
Mesmo que tenhamos de passar mais um ano a dar chutos na trapeira.
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